Existe o fracasso da educação pública, e existem causas.

O fracasso da educação pública é algo assimilado pela opinião pública brasileira. É como falar sobre a corrupção na política. Admite-se, mas não se enxergam causas nem soluções. É mais um mal da sociedade brasileira que, grosso modo, nem adiantaria trazer para a discussão. Poderia ser mais um tema para humorísticos e discursos de palanque, mas o brasileiro não quer se envolver no problema. Rende reportagens na televisão, denúncias na imprensa, mas não é algo que tire o sono daquele que frequenta uma escola ou manda seu filho passar horas diárias em uma delas. Nada além de mais uma fraqueza do país.
Existe uma vasta bibliografia sobre o fracasso da escola pública. Mas que é feita para educadores preocupados com currículos e metodologias. Na verdade, é um diálogo que se efetiva apenas no meio acadêmico. E que acaba influenciando decisões políticas. Estatísticas, avaliações institucionais. No entanto, quem trabalha ou trabalhou na escola pública e, além disso, estudou nela, sabe que as causas de seu fracasso se evidenciam nas ações cotidianas ali praticadas. Há inúmeros culpados. Diretores, professores, alunos, pais, pedagogos, burocratas.
Existe uma máscara encobrindo as causas desse fracasso. E que encobre soluções que ultrapassem os âmbitos curricular e metodológico, com todos os recursos físicos que estes envolvem. A máscara cria falsos mitos para encobrir os verdadeiros culpados. Ela erige falsos mártires. Transforma em vítimas aqueles que são imediatamente culpados pelas ações que levam ao fracasso. E que insistem nessas ações.
Não há dúvida: as causas são muitas. Vão desde a aula mal dada à aula nunca dada. Entre uma e outra, a máscara é construída por todos que estão envolvidos no processo educacional. E atrás dela existe um mundo inacreditável, que a imprensa não denuncia, que o acadêmico não coloca em suas pesquisas, que a autoridade finge não perceber, e que existe porque inúmeras pessoas ganham com esse fracasso. E são ganhos de inúmeros tipos.
Por que não falar sobre isso? Mas falar do ponto de vista de alguém que presenciou cada uma das causas desse fracasso aqui apontadas. Desde a vida como aluno até o trabalho como professor e pesquisador. Alguém que estranhou a probição que recai sobre essa discussão. E que passou a ver a própria discussão oficial sobre o assunto como uma máscara. Dizer que a escola ganhou um computador ou que não o possui é só uma forma de não se dizer que o instrumento vai ser usado para burlar o processo pedagógico. Mas, quem o disser estará fora da dança de quadrilha que é o debate sobre educação, não formará um trenzinho nem girará no círculo daqueles que se envolvem no assunto.
É preciso ter a coragem de dizer: na educação pública acontece isso, acontece aquilo, e tudo isso gera o inevitável: o fracasso. Que nenhum dos programas oficiais voltados para a melhoria do ensino público vai conseguir vencer. Tal como a escola pública acontece hoje, ela só poderá acabar em falência completa.

domingo, 30 de setembro de 2012

Conselhos de classe com atas irreais, como os dessa escola de Londrina

Postado por uma professora no Facebook:

Em Londrina tem escola pedindo para os professores fazerem novas avaliações de recuperação do 1º e 2º bimestre, "para não precisar fazer reclassificação no ano que vem"... A intenção é facilitar para aprovar os alunos e fazer subir o índice do IDEB (mascarando?). O duro é saber que nenhum professor tem coragem de expor a indignação e ir contra esse tipo de deseducação dos nossos alunos, lastimável!
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Já que o assunto foi mencionado em uma rede social, é interessante estender um pouco a conversa.
Conselho de classe. O que seria isto?
Uma forma de se legitimarem ações que, sem a força de um conselho, seriam ilegítimas, imorais, irracionais, e que não teriam como suporte apenas a palavra do professor. Nem quando ele está certo.
A escola passou a chamar de "conselhos" essas formas de se auferir à escola direitos que, muitas vezes, a Constituição ou o Código Penal negam.
Para se beneficiar o mau aluno, o pai que acredita que uma "carteirada" abre todas as portas, existe o Conselho Escolar. Cria-se um conselho escolar para livrar o mau aluno das responsabilidades que, normalmente, estão no próprio regimento. Através da autoridade do conselho escolar, o aluno que explode um banheiro ou incendeia um carro de professor pode ser liberado de responder por isso junto às instâncias responsáveis fora da escola. Principalmente, se esse aluno for filho de algum prefeito ou pedagoga, como aconteceu em Cruzmaltina e Faxinal, ou filho de algum membro da APMF, como em Curitiba. E quem acredita que no Brasil só há diretores e pais honestos jura que não há dinheiro envolvido no que se decide em tais conselhos. 
Para se beneficiar o professor, ou a escola se livrar de enfretar seus problemas, há o Conselho de Classe. Da mesma forma, no início do ano se modifica o Regimento Escolar. Se algum professor acha errado dar recuperação, exclui-se esta do regimento, mesmo as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional deixando claro que recuperação é obrigação da escola e direito do aluno. Se algum professor tem saudade de quando ele era obrigado a decorar até o hino do exército, isto passa a ser exigido do aluno. É no regimento que a escola burla as deliberações estaduais ou leis federais. E aqueles funcionários que foram parar em cargos nos núcleos porque algum parente dormia com algum político influente passam a validar todas as ações que constarem em algum documento escrito. Nas escolas, a ata é essa grande bíblia da fraude e da construção de verdades extraídas do côncavo da lua. É muito comum a reunião em que se conversa sobre o que colocar em uma ata, já que a verdade que se extrai de alguns encontros pode ser origem de inúmeros dissabores. Uma delas eu citei aqui neste blog: a ata da reunião em que o núcleo de educação tentava justificar o fato de os professores terem assinado atas de reuniões que nunca ocorreram, mas nas quais o interesse de um grupo era validado, e o diretor mentia o teor das mesmas. Tal como o núcleo disse então que esse procedimento é usual, também se veria no caso citado pela professora de Londrina um exemplo de eficácia na hora de solucionar os percalços da rotina escolar. Que poderiam render prêmios de gestão, como no caso da Escola Ângelo Trevisan, em Curitiba. Uma boa ata inventada por um conselho escolar sem interesses pedagógicos transforma um regimento inconstitucional em modelo, ou besteiras repudiadas cientificamente em demonstrações de envolvimento da comunidade.
Para quem não sabe, há uma deliberação estadual que regimenta os conselhos de classe. Uma, estaduual, no site Dia-a-dia Educação; há outra, federal, no site do Conselho Nacional de Educação. Eles são deliberativos, e nada pode ser resolvido na base da votação, para que a reunião acabe logo. Os conselhos são eventos abertos. A lei estadual diz que é algo a ser implantado. Algo que já aparece nas leis federais. Algumas escolas já vinham fazendo conselhos de classe na quadra de esportes, para que os interessados pudessem assistir a eles. Na prática comum, o conselho de classe é imposto como um evento sigiloso. O professor não pode sequer falar sobre ele com algum aluno ou pai, mesmo esse evento tratando da vida deles. Mesmo as leis garantindo a eles o acesso ao conselho e ao que se decide nele. Há professores que fazem escândalos homéricos quando chega a eles a informação de que algum aluno ficou sabendo se está ou não reprovado. Ontem, sábado, houve conselho de classe em Faxinal. No final do ano, ele é feito aos sábados para que se passe o tempo suficiente para que o aluno não possa recorrer, caso ele reprove. No meio do ano, sábado é uma garantia de que não se vai ficar muito tempo em discussões. A professora já marcou hora no salão, o professor tem academia dali a pouco. É muito comum que os professores assinem a ata ainda em branco, ou que esta lhes seja dada muitos dias depois, durante o recreio, para eles assinarem. Em ambas as circuntâncias, ela nunca é lida. Por isto, podem-se ocasionar fraudes, como no Colégio Padre Gualter Farias Negrão, em Cruzmaltina. Em 2008, o conselho final no referido colégio ocorreu em um sábado com churrasco e amigo secreto. E uma pressão cerrada da diretora para que tudo acabasse antes das onze horas da manhã. Que não se deliberasse, apenas se votasse; nada de se ouvirem argumentos.Também havia um casamento a que uma pessoa precisava ir, e o conselho não poderia se arrastar. Em 2006, o conselho final, no mesmo colégio, foi regado a cerveja. Assim que os primeiros pedaços de carne estavam assados, diante da porta da sala onde ocorria o conselho, foi difícil segurar alguns professores. Em princípio, era comum ver aquele notório alcóolatra com uma lata de cerveja ao lado de seus registros escolares. Aos poucos, ele ficou lá fora e apenas gesticulava dizendo que não tinha nenhum problema para resolver, que os presentes fizessem o que bem entendessem. O exemplo foi seguido. As últimas turmas a serem objeto de discussão foram abordadas por menos da metade de seus professores. Nada disto consta na ata. Em 2010, o conselho do segundo trimestre foi interrompido para que se fizesse uma festinha para a pedagoga, que entrava em licença. O conselho foi interrompido por um bolo e um vaso de orquídea e não foi retomado.
Sempre, o professor que se esquiva diz que não tem problemas com aluno, como se o conselho tratasse da vida dele, que não tivesse preocupações. Mesmo naquelas escolas em que 70% dos alunos são aprovados em conselho de classe, pois não alcançam nota. Caso do Colégio Nossa Senhora Aparecida, de Curitiba, que realizou uma palestra sobre dança na data de seu conselho.
É muito comum, nessa hora, que a pessoa que preside o conselho apenas pergunte: "APCC?", assim mesmo, como se fosse um novo jargão escolar. E os professores respondem: "APCC". Já se ouve o verbo "apececezar" na boca de professores mais irônicos. Rotina de escola. O que acontece nesses conselhos fica secreto. A ata é sempre um meio para se legitimarem ações imorais, como a do professor que não vê com bons olhos a anotação "APCC/6,0" em seus livros de registros, então ele usa um lápis-borracha, apaga as notas do aluno e lhe confere outras, para que o mesmo apareça como "Aprovado". Normalmente, isto acontece quando os pais do aluno são notórios encrenqueiros, daqueles que reclamam mesmo conhecendo as atitudes do filho, que obrigam os professores a fazerem conselhos nas férias para reverem notas. Um aluno da Escola Ângelo Trevisan usou este fato como argumento em uma discussão com uma pedagoga. Bastaria seu pai entrar com processo e ele seria aprovado. Estava claro que o aluno era apenas a voz que reproduzia o discurso do pai. A pedagoga anotou em ata, e eu tive o cuidado de gravar a cena em áudio. Está na hora de colocar esse áudio em espaço público.
O professor desiludido passou a achar que dar notas e aprovar é uma garantia de poder ter sossego, não interessando os problemas pedagógicos ou morais decorrentes do ato. Aluno é meio de vida, apenas isto. Ele é passageiro e não merece uma preocupação duradoura. Nada que tire o sossego das férias. Ou que faça a diretora ter que localizar aquele professor que nem é efetivo para uma reunião de emergência. Em 2008, uma dessas reuniões ocorreu no Colégio Olavo Bilac, em Faxinal. O aluno reprovado tinha deixado de assistir às aulas de português em setembro, para não ter que escrever textos ou produzir textos orais. Ele também jurava de pés juntos que jamais em sua vida leria um livro. Viera de uma escola curitibana e lá nunca produzira nem lera textos. E era um aluno de oitava série. Ficaria difícil saber como ele chegou até ali, para quem não conhecesse as escolas da capital paranaense. Mas o aluno deixou as aulas, mudou de cidade até. No ano seguinte, veio uma instrução do núcleo para que o aluno fosse aprovado, porque se alegava que a escola não dera a ele chances de recuperar a nota.
São eventos ridículos assim que fazem a escola de Londrina querer adulterar notas, modificar em outubro o que se registrou em abril. Ou uma pretensa recuperação anual, como se praticava antigamente. Em toda parte é assim. Mas a escola sabe que hoje o aluno teria razão, mesmo no caso desse do Colégio Olavo Bilac. Por isso, o professor prefere, tamtas vezes, a lata de cerveja nos conselhos de classe, que a preocupação de registrar a verdade inegável dos fatos ocorridos.
A verdade não tem nada a ver com atas. Ao contrário do que Rosely Sayão escreveu na Folha de São Paulo deste domingo, a escola precisa de câmeras. A verdade não pode depender só de palavras, escritas ou pronunciadas em conselhos inventados para obscurecê-la.        

domingo, 23 de setembro de 2012

Sexta-feira: dia de diretor esperto


Antigamente, era a segunda-feira o dia cansativo. A escola encarregou-se de mudar essa visão. E fez da sexta-feira um dia perdido.

Primeiramente, pela paixão por empurrar recessos para esse dia. Depois, porque criou na comunidade escolar em geral a ideia de que tudo que se fizer nesse dia é apenas por exigência do sistema. Então, nos anos 90, pôs-se a hora-atividade nesse dia, e esta era apenas uma possibilidade de a escola ser fechada mais cedo, do tipo a gente já fez tudo que tinha para hoje.

Na hora de fazer horário, os professores não querem trabalhar na sexta-feira. É comum, então, empurrar-se a disciplina que não reprova, como Arte ou Inglês, o que significa um convite para a falta sem prejuízo. Hoje, já é mais complexo fazer isso. Algumas escolas preferem fazer de conta que é o aluno mesmo que não aparece, sem nenhum aval da instituição. O que é aparente.

Em 2011, o diretor do Colégio Santa Felicidade me alertou que sexta era um dia perdido, em que todos podiam descansar. O fato é que a ausência do aluno gerou transtornos, e a escola viu-se na obrigação de coibir as faltas. Criou um relatório que o aluno deveria fazer ao final da última aula, mas que, na prática, representava apenas a possibilidade de se obter nota pelo cumprimento da frequência, prática corriqueira no sistema público. O exemplo abaixo reproduz um desses relatórios.

Repare-se que ele não possui os elementos textuais de um relatório. Não tem os dados obrigatórios, como o que aconteceu, quando, onde, os objetivos, os meios usados, é apenas um conjunto de cinco a dez linhas que o aluno escreve e (pasme-se) vale 25% da nota total. Repare-se que a escrita do aluno de ensino médio faz pensar em frases soltas feitas por alunos em fase de alfabetização. O relatório vira questionário, como em tudo mais que se usa para avaliar. Não há profundidade, não há coesão, não há coerência. O modelo crasso da escola que, segundo o núcleo de educação, achou uma solução para um problema.  

Outros modelos podem parecer surreais. Como o que o Colégio Padre Gualter Farias Negrão fazia. Foram inúmeros meios. Entre 2005 e 2006, a ideia era apenas deixar que o aluno não fosse à aula para ir a uma feira de hortaliças mais dois ou três outros produtos, feita nas noites de sexta. Nada que pudesse distrair a atenção de jovens, além de uma barraca com bebidas. Ou um alto-falante tocando música sertaneja. Mas bastava: até o final da década a existência de tal feira foi pretexto para explicar mesmo ao núcleo de educação por que não havia aula às sextas. Dizia-se até mesmo que o som vindo da feira prejudicava a atenção dos alunos.

Aos poucos, a sexta-feira virou uma estratégia de malandragem. Por exemplo, uma professora assumir uma disciplina à noite e exigir todas as aulas de uma turma naquele dia, já sabendo que não terá com que se preocupar. As aulas nesse dia eram um presente a quem se conhecia de longa data. Ou o motorista do ônibus escolar parar nesse dia, dizendo que merecia uma noite para ficar em casa.

Lembro em 2010, um grande aluno do período da manhã, para quem dei aula durante cinco anos, e que passara para noite. Eu o encontrara por acaso. Ele me dizia, sentado em um banco diante da escola, sobre como seu rendimento diminuíra à noite. Eu lhe dizia que não voltaria a trabalhar em período noturno, desde que concluíra as aulas do meu doutorado. Um aluno dedicado. Quando estudava a oitava série, concluiu o último trimestre com 9,0 de nota, e isso não lhe agradou. Perguntou qual de suas atividades ele poderia fazer novamente. E eu lhe indiquei o bônus que propusera à turma: o aluno que quisesse fazer um trabalho sobre obra literária além do obrigatório, a ser exposto como seminário para toda a turma, ganharia um bônus de 1,0 ponto. Ele leu uma obra em 3 dias e a expôs. Chegou a 10,0, e era uma cultura comum entre aqueles alunos da manhã o querer bons resultados. Ele me contou que à noite nunca lera. Mas lamentou que, todas as sextas, os seus antigos amigos saíam da aula na hora do intervalo e faziam um happy hour na casa do diretor que, segundo ele, atraía os alunos até o horário do transporte escolar. Naqueles dois anos, era comum ficar-se sabendo que um novo adolescente começara a fumar naquelas noites sem aula. Foi lamentável ver, durante a festa de dia do estudante em 2010, o diretor entregando tabaco a um desses alunos. Fotografei a cena, que evito divulgar em respeito à mãe do aluno, que me disse ser contrária ao vício do filho. Fiz questão de me certificar de que o tabaco era mesmo para o uso do aluno. Essas facilidades do período noturno sempre foram e sempre serão uma estratégia para reeleição de diretores, porque esses alunos votam. Seja na capital ou no interior.

Aquele mesmo aluno, que me relatava estar desenturmado no período noturno, demonstrava querer aulas durante o período das cinco aulas, mesmo sendo obrigado a estudar à noite porque trabalhava. A cultura de que todo aluno de período noturno deseja evadir-se tornou-se uma palavra oficial de toda escola. Dizer que o aluno não vem à escola é uma praxe criada pela ação de não coibir a falta, de não se fazer desse dia um dia efetivamente letivo. Fala-se que a culpa é do aluno. Mas este já sabe, desde que ingressa na instituição, que ela mantém tal praxe. Vocês não vêm e a gente não dá nada importante. Daí ao professor já ter reservado mesa nas pizzarias para a noite de sexta é um passo. Que há muito vem sendo dado. Coisa de brasileiro simpático e de bem com a vida. Que não perde uma eleição para o cargo. E que, graças a isso, pode até pleitear outros cargos.

sábado, 22 de setembro de 2012

Briga entre aluno e professor? Conta outra, vai.


Estou pensando no fato noticiado com grande estardalhaço nesta sexta-feira: uma briga entre professora e aluno, em escola particular.

O contexto muda tudo. Pensa-se que o poder aquisitivo coloque os professores na condição de servos do aluno, e que este sempre vai representar uma classe social onde não há delinquentes, ávida por ensino de qualidade. O poder aquisitivo faria desse aluno um cliente que quer, de fato, as coisas que uma boa escola pode lhe dar. Ledo engano.

No ano passado, tentei trabalhar em uma escola particular que insinuava que seus alunos tinham aula de valores. De chofre, me defrontei com a clientela menos ética da cidade de Curitiba. Valores, só os que eles tinham nas carteiras. O nível de valores morais estava abaixo até mesmo daquelas garotas de Cruzmaltina que pulavam o muro da escola à noite e, durante o período das aulas, faziam streap-tease numa casa noturna de Borrazópolis, mas que apareciam com nota e frequência no final do trimestre, sob os auspícios do conselho tutelar e da direção do colégio. Em um bairro nobre da capital. Havia o pré-adolescente que chegava no carro pink da mãe, e a pedagoga avisava aos professores que aquela era notória usuária de drogas. Outro vinha na caminhonete nova compartilhando o tabaco do paizinho, garoto de doze anos. Poderiam ser apenas crianças, mas todo o seu arsenal era gasto para a troca de mensagens de caráter erótico através dos aparelhinhos. Usavam capuzes apenas para escondê-los durante as falas da diretora. Deixavam claro seu vício por narguilé. As garotas de quinze anos erotizavam os meninos de dez, com carícias e palavras de sentido sensual, de maneira que os pequenos já não conseguiam permanecer nas salas de aula. Usavam o contraturno para carícias e palavras. As de doze iam à escola apenas para manterem contato com os rapazinhos da oitava série. Usavam a desculpa de passeios no bosque e aulas de leitura apenas para sumirem entre chorões e moitas de capim. Já era um ritual: escrita de aluno em fase de alfabetização, mas chegavam a não levar o material em certos dias apenas para se embrenharem no bosque e lerem seus Harry Potter. Uma delas era filha de uma pedagoga de escola pública. A notória vocação para a falsificação de atividades, enquanto a garota apenas passava as manhãs aos seus aparelhinhos conversando com rapazes, deixa evidente que a mãe é uma pedagoga de escola pública da região de Santa Felicidade. Uma mãe, professora e pedagoga, vem me perguntar como era a elaboração de um livro a partir de uma letra de música, que eu tinha pedido a seu filho; a atividade vem feita com a letra dela, e o aluno, como sempre, acha que pode terminar até a universidade com a mãezinha fazendo as tarefas. Mais que isto, o eterno coelho que se tira da cartola ao final de bimestre: uma dança de funk a partir de uma letra erótica e coreografia injustificável para o espaço escolar representa 2,0 pontos da nota, tal como no bimestre anterior fora uma festa junina, e assim ad infinitum. Três meses e nenhum pagamento. De fato, aquilo era o paraíso para aqueles alunos. Mas não tem nada a ver com o conceito de schola que vem desde a Antiguidade e quem tem formação científica aprende a amar. Então, deixa-se. Não é possível estar-se escrevendo um artigo sobre a retórica de Aristóteles e trabalhar em um uma escola assim. Eu era o sexto professor da disciplina no ano.

Essa escola particular não tem como formar um aluno diferente dos que eu conheci no Colégio Nossa Senhora Aparecida, em Curitiba: o adolescente que um dia vai manter o filho das pessoas de colégio pago sob a mira de um revólver, ou possui uma ficha na biblioteca do Farol do Saber da esquina apenas para pegar os livros emprestados e usá-los para enrolar baseados. É o mais perto que tais alunos vão chegar da grande literatura. Faz lembrar aqueles alunos que, em Cruzmaltina, levavam aqueles fabulosos volumes encadernados dos Irmãos Grimm para os pais enrolarem seus vícios. Em toda parte, é assim.

Mas o fato em Santos me fez pensar em outro, ocorrido em 2008, no Colégio Padre Gualter Farias Negrão, em Cruzmaltina. Daquela vez, eu já sabia como a história iria acabar. Ocorreu com uma professora de história, séria e compenetrada, daquelas professoras que têm um objetivo a atingir, e não admitem que façam piada da sua aula. Mas o aluno já era um adulto. Fora nosso aluno em 1996, adolescente, e tinha sido um grave problema. Deixara a escola. Voltara. Adulto, era funcionário da prefeitura, e isto lhe dava prerrogativas, como a de fazer o próprio horário ou rir do momento cívico. E de ir à escola apenas porque a lei exigia o ensino básico para ele poder surfar no serviço público sob os auspícios de quem exercesse o poder. Liderava um grupo formado por um rapaz da tropa de choque do narcotráfico na cidade, vítima de abuso sexual e pouco afeito às regras escolares. O sobrinho de um general do narcotráfico, outro de seus acólitos, esperou anos por alguém que fizesse a diretora tremer. Uma senhora de moral não muito ilibada para uma cidade pequena, que era a sua amante da vez, fazia o jovem se sentir em casa. E havia o rapazinho rico, que aos dez já circulava de moto na frente da polícia e que daria vinte anos de vida para ter na testa o rótulo que os colegas ostentavam.

Naquela vez, a briga foi com a professora. Novamente, eles faziam as regras. Entregaram o que quiseram para ela, sem respeito a instruções, que reorientou para que fizessem do modo certo. Ridicularizaram-na, mandaram que ela enfiasse o trabalho lá onde pessoas sem educação e acostumadas a drogas não têm pudor em dizer. E a deixaram sem ter com quem reclamar: a pedagoga também era funcionária da prefeitura. Na noite seguinte, o dito aluno fez uma pilha de carteiras atrás da porta da sala, de modo que caíssem sobre a professora, assim que ela abrisse a porta para entrar. E quase aconteceu. A professora teve que ouvir desse aluno o que o rapaz lá de Santos nunca deve ter falado ou escutado. Sob a admiração dos colegas, que tinham um líder.

Evidentemente, a escola acalmou a professora e fez com que ela não denunciasse o aluno. O peso da proteção do prefeito pesou mais que todas as provas. E, como sempre, a professora viu a escola como um espaço inviolável, onde se constroem conhecimentos e até valores. Pensou decerto que estava próxima a sua aposentadoria. Mas deixou que a escola tivesse um precedente na sua história: o aluno era sim inexpugnável, mesmo quando imputável criminalmente.

Se ela tivesse agido em outro sentido, teria criado talvez um precedente para ser lembrado, sob o qual colegas pudessem um dia se abrigar.

No ano anterior, eu fora a vítima. Era apenas para fazerem uma elaboração de numerais por extenso em inglês. Individualmente. Mas o grupo de colegas fez os mesmos numerais e tentou me convencer de que não houvera cópia. Como não quiseram refazer, cancelei a atividade. Então o aluno maior, com um hálito pestilento de cachaça, mesmo sendo motorista, arrolou os seus acólitos e eles tentaram fazer um abaixo-assinado. Eu mesmo lhes dei o telefone do núcleo. Passaram dois meses matando aula, jogando baralho, enquanto um terço da turma assistia às aulas. O núcleo veio para intervir, mas disse que de fato eu não vira os alunos copiando um do outro. Eu pedi que fizessem um cálculo de probabilidade para verificarem a possibilidade de cinco alunos elaborarem o mesmo conjunto de algarismos. Aguentei a ira da diretora, que deu razão aos alunos, e achava que não se pode recusar nada do que um deles faça, mesmo que não corresponda ao pedido. A funcionária do núcleo também deixou evidente que entendia tanto de pedagogia e metodologia de ensino quanto de física quântica ou sânscrito, outra daquelas pessoas formadas em faculdades de final de semana, que um dia ficam felizes porque conseguiram derrubar uma deliberação que estabelecia que 2 + 2 = 4, e veem o fato como progresso.

O que ocorreu em Santos é rotina nas escolas brasileiras. Não vai mudar. As coisas se tornam piores para o professor e para alguns alunos que, de fato, querem da escola aquilo que, por princípio, ela deve oferecer. Em Santos, o fato foi gravado. Sorte de todos. Hoje, gravar as aulas é a única forma de se desmascarar a indústria do aluno vítima e dos pais que já sublinharam na lei tudo aquilo que eles podem usar para que seu filho, como os alunos de Cruzmaltina aqui citados, sejam aprovados. E possam todos correr para o bar mais próximo comemorar.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Quando falsificarem sua assinatura, lembre que foi você que escolheu trabalhar em escola pública


Vêm chegando os dias terríveis. Hoje já vi fotos em rede de alunos passeando em hotéis-fazenda, aquilo que se torna uma rotina nos últimos meses. Impede que se dê todo o conteúdo. Faz com que o aluno passe esses meses em ensaios para apresentações que duram dois ou três minutos. Quando ele vai à escola.

Faz dois anos que fui a dois conselhos de classe largamente prejudicados pelo tema: Os professores vão ou não à carreata do candidato a governador?

O primeiro tinha ocorrido na sexta, no Colégio Padre Gualter Farias Negrão, em Cruzmaltina. A pedagoga apresentou um papel enviado pelo núcleo de educação convidando os professores para a carreata do candidato da situação, que seria lá em Apucarana. Lógico: viagem, combustível, ida, volta.  Tudo isso merecia que se dispensassem as aulas. Mas os professores preferiram não ir, seria aborrecido demais. E daria margem a polêmica, pois nem todos aceitariam.

No sábado cedo, a situação se repetiu. Agora em Faxinal, no Colégio Olavo Bilac. Lá estava o convite. A carreata seria na terça, e o professor que fosse não levaria falta. A discussão recai sobre a inutilidade de se fazer algo que não dispense o aluno. Ter que ir a um evento não livraria o professor das horas que ele passaria ocupado. Então, não era uma proposta aceitável. A ideia de quem formulou a proposta era fazer mesmo quem fosse contra aquele candidato acatar a ideia só para ganhar um dia de folga. Não ter dado certo foi um imenso progresso. Mas, para quê? Aquele colégio tinha sediado uns jogos durante setembro e nos dias de reposição os seis alunos presentes passaram a manhã jogando Uno.

Eu tinha tentado informar algum candidato da oposição na noite anterior daquele abuso de poder. Entrei nos sites, mas não havia espaço para postar uma cópia daquele documento. Quando saí do conselho, fui a uma loja procurar um produto. Minutos depois, entrou um candidato a deputado estadual por um partido de oposição. Expliquei a ele o que tinha acontecido, e ele disse que tomaria providências. Não deve ter tomado. Fora prefeito de uma cidade importante e promovera uma revolução na educação, que virara modelo.

Enquanto isso acontecia em Faxinal, no colégio de Cruzmaltina o diretor e alguns professores protegidos escolhiam uma comissão, que deveria ser pleiteada entre o corpo docente. Semanas depois, os professores ficam sabendo que tinham assinado uma ata falsa, sem saber do que se tratava, na qual apareciam seus nomes como tendo escolhido para a comissão os nomes preferidos do diretor. Não se dá muita importância ao caso.

No sábado seguinte, os professores precisam comparecer ao colégio. Um grupo de pessoas do núcleo faz uma reunião. Colocam-se francamente a favor da atitude do diretor, dizendo que esses ajustes são procedimentos normais. Citam casos em outras escolas. E dizem que somente ali existe aquele desconforto. A professora que o diretor escolhera para a comissão vai à frente e faz um discurso falsamente moralista em favor desses ajustes, que aconteceriam sem problema em todas as escolas, menos ali, e a tônica recai sobre a figura da professora que fizera a reclamação, que ainda não havia chegado. A professora chega, e acusa a chuva forte de ter impedido sua saída do sítio. Pede a palavra, e esta lhe é negada. Tanto o núcleo quanto a direção tentam impedir sua fala, mas ela se afirma e faz um discurso pela transparência nas atitudes. Ela, que exercia o cargo de documentadora, será tirada da função. O diretor muda de lado político e rompe com ela, que era líder do partido do governo. Poucas semanas depois, a escola passa a flertar com a prefeitura, emprestando móveis, mas principalmente combinando dias sem aulas, em que o transporte escolar não funcionaria. Foram dias e dias com quatro alunos na escola, jogando tênis de mesa. No domingo houve festa na paróquia, dois dias sem aula; morreu um morador, dois dias; quinze de novembro, inventa-se um recesso; no dia da consciência negra, dois dias... O vice-diretor chega ao portão e manda os alunos que vieram irem embora, a pedagoga os chama de chatos, caxias.

Nenhum problema: como repor tantos dias sem aulas, se as duas primeiras semanas de dezembro são dedicadas ao rodeio, e o prefeito não cederia transporte para os alunos nem com decreto presidencial? Simplesmente, acaba-se de uma vez com essa história de aula, aluno, transporte... Só não se divulga o resultado final antes da data, que é crime, e o aluno pode recorrer. Faz-se conselho final no sábado exatamente para que, quando o aluno olhar o edital na segunda, já expirou o prazo para que ele possa recorrer.

Esses dias estão chegando. E 2012 é ano eleitoral, de novo.

(Antes que me esqueça: Há um mês, uma grande rede de supermercados paranaense foi condenada por trabalho escravo e por infringir leis trabalhistas. Na internet, abaixo da notícia, os comentários dos leitores diziam que os empregados é que eram safados, ninguém os obrigava a trabalhar lá; se lá não obedeciam leis, que buscassem outro emprego. Eu ouço a mesma coisa há quase vinte anos. O ensino público não cumpre as leis, vá trabalhar em outro lugar.)

terça-feira, 18 de setembro de 2012

A voz do aluno: mais atendida que escutada


Rosely Sayão afirma, no artigo “Escolas surdas”, que as escolas brasileiras não têm dado voz aos seus alunos.

 

Mas muitos vão porque percebem, com clareza ou às vezes só por intuição, que os alunos -seus filhos- podem ter muito o que dizer na escola, mas dificilmente serão escutados, levados a sério. E note, caro leitor: eu disse escutados, e não atendidos.

 

 

A psicóloga acredita na voz dos jovens como correspondendo a um franco interesse em melhorar escola e qualidade de ensino. Essa voz ainda é problemática. Se ela não se faz ouvir de modo sistematizado, é a intenção do aluno que acaba dando origem às grandes soluções. Gincanas, prendas, passeios... Faz-se o que, mesmo sem confessar através de meios oficiais, a voz desse aluno deseja. E ele volta para sua casa feliz, não sem antes passar na lanchonete e jogar seu fliperama, ou passar horas jogando truco com os colegas.

Quando o governo criou a hora-atividade, e ela era uma só, a escola a empurrou para o último horário de sexta-feira. Se alguém quisesse dispor do horário para alguma apresentação, uma visita, uma palestra, os alunos iam embora irritados: “É bem capaz que a gente vai ficar na escola na nossa aula vaga!” O interesse do aluno estava sendo feito. Quando se quis usar esse horário para aulas de reforço, ficou claro que o aluno preferia a reprovação a não ir embora. Aliás, a maioria ficava esperando o transporte, encostada no muro.

Tudo bem: isto acontecia em uma época em que o aluno chegava à quinta série escrevendo pisola para “pessoa”, e as professoras da rede municipal estavam felizes, porque as mais velhas tinham sido dispensadas (todas) e aquelas que ainda cursavam magistério assumiram. Quantas vezes eu vi cadernos de alunos de oito, nove anos, e o conteúdo eram as realizações da administração municipal ou estadual? 

Quando foram criadas as fichas de Correção de Fluxo, em 1998, bastava o aluno permanecer o tempo suficiente para responder às fichas do dia e ele podia ir embora, os professores ligarem o aparelho de som alto antes de tomarem seu lanche e partirem – já não havia ninguém.

O perigo era tornar as coisas certas demais. Por exemplo, a existência de uma APMF eleita por maioria absoluta de pais, de presidentes de turma que faziam abaixo-assinado quando um professor fazia o que aluno relata abaixo em mensagem virtual:

 

VIRTUAL v7.0 - 12 de fev - Privado

Para:

XXXXXXXXXX

e ai professor o que vc acha de uma professora que propos um contrato para nós no primeiro dia de aula com ela o contrato era o seguinte de nós assinarmos um papel pra ela e ai todos nós seriamos aprovados na matéria dela sem precisarmos fazer nada e tinha a outra opção que era estudarmos isto é aceito pela direção da escola .

 

 

Talvez a professora apenas quisesse testar a turma. Suscitar um “Oh! Não! A gente quer aprender.” Mas existem exemplos conhecidos que não. Em 2007, uma aluna de sétima série me mostrou um abaixo-assinado, para que eu encaminhasse, contra uma professora que teria oferecido notas em troca da compra de brindes para uma promoção realizada por outra escola, a qual ela dirigia. Guardei uma cópia, mas a escola ignorou o documento. Na verdade, a própria diretora já recorrera ao expediente em anos anteriores. Imperativo categórico: faça de cada evento, cada palestra, cada dança, cada gincana, cada batata doada, 0,5 ponto ou mais de nota, e no final do ano poderá ir para casa mais cedo. Então a escola passa a ter a figura do típico esperto: ele está matando a aula, jogando três cortes no pátio, pede um minuto de licença e entrega ao professor um papel carimbado valendo 0,5 ponto. O professor dizer que não vai aceitar significa comprar uma briga com direção e pedagogas. Os pais que só vão à escola quando há jantares e presentes aparecem para reclamar esse 0,5 ponto. “Meu filho já tem 9 desses, acha que vou perder?” A diretora fala como um vendedor de C&A: “Não, a senhora tem toda a razão. Eu mesma vou dar essa nota.”

Logicamente, a primeira atitude dessa diretora é fazer algo parecido com o que Rosely Sayão diz ocorrer. As turmas param de votar em um representante, que passa a ser escolhido dentre uma lista. O aluno sem opinião, o que vai às reuniões mas não diz uma palavra. Aquele que a diretora visita aos sábados com presentes e promete que vai levar sua irmã para morar com ela. Nenhum perigo de aluno com poderes. O próximo passo é neutralizar uma provável oposição. Assim, a eleição para professor representante de turma é cancelada, e este passa a ser opção da diretora com as pedagogas. Mesmo o Conselho Nacional de Educação incentivando a prática. A APMF? Fácil: não se divulga muito a eleição. Vão apenas os interessados. Então o núcleo de educação apoia a eleição, baseada na ideia de que ninguém se interessa, e os presentes na reunião viram heróis. Já vi diretoras venderem coleções de livros didáticos para comprarem badulaques como um letreiro iluminado com o nome da escola, com aplauso de APMF. Mas é comum que o cara forte da APMF finalmente possa rebocar aquele muro que está enfeiando sua casa.

No mais, por que se dar voz ao aluno, se ele falará futilidades? Como diz Sayão, para quê? Na verdade, ele já está feliz. Em 2006, minha diretora pediu as notas finais e definitivas para o dia 20 de novembro. E fez disto uma alegria geral. Era possível vê-la dizendo às crianças no pátio, que jogavam três cortes e diziam estar cansadas de aula, que ela já iria acabar com as aulas, e só quem devesse nota ficaria até 20 de dezembro. Quando o professor dizia, em sala de aula, que as aulas iriam até dezembro, o aluno respondia de forma peremptória: “Quem manda é a diretora e ela disse que até dia 3 todo mundo estará de férias.”

Chegava dia 3, e não havia alunos. Aos que vinham, a pedagoga ameaçava do portão: “Se vocês ficarem aí, a gente vai ter que dar que dar aula. Por que vocês vieram?” Então, eles diziam que tinham vindo para assistir às minhas aulas, e a gente ficava assim. No segundo dia, escondiam-se chaves. E a gente estudava sentados na arquibancada da quadra. Os alunos vinham, e já estavam aprovados há muito. Era a cultura do gosto pelos projetos em andamento e a vontade de ver os assuntos até o fim. Alunos que depois ganharam bolsas em faculdades. Grandes leitores. E eles traziam os que precisavam de nota, que chegavam a ela sem precisar de conselhos de classe. Os piores, os que passavam o ano lutando para não ler, não escrever, não falar em público, esses não vinham. Era comum que entrassem com processos quando reprovavam. Já era previsível: em fevereiro, março, esses alunos já falavam que não poderiam reprovar, que eles estavam sob proteção, e não iriam fazer tarefas. Tenho aqui comigo uma gravação feita por um aluno chamado R., em que ele relata que a mãe recebeu oferta por uma aprovação sem os percalços do ano letivo.

Lembro o mês de novembro de 2008. Eu tinha duas aulas de português com a oitava série, uma das melhores turmas possíveis, mas onde havia duas alunas, da comissão de formatura, usando a condição para não terem que comparecer às aulas. Aos poucos, elas estenderam esse poder à sala toda. Em uma sexta de outubro, a diretora os colocou em um ônibus e levou a uma semana cultural em uma escola pequena de outra cidade. Lá, essas garotas provocaram uma imensa briga, e foi preciso sair da semana cultural e fazer o que elas queriam: uma lanchonete, refrigerantes, e alguns rapazes para anotarem seus celulares. Na semana seguinte, chovia havia dias. Era uma quinta, eu não tinha aula com a turma. Mas a escola levou todos os alunos a um parque aquático. Era insuportável o frio. Na volta, havia um acidente sério na estrada, com morte, mas os alunos estavam com a voz mais ativa com a qual sonhavam: estavam terminando o ano letivo fora da escola.Na semana seguinte, jogos interclasses; uma mãe foi reclamar da falta de aula, mas foi reputada apenas como encrenqueira Na semana seguinte, sexta, fizeram outra excursão, outro parque aquático, desta vez caro e distante. A presidente da comissão de formatura era a pessoa que mais devia notas, graças a tantas ausências. Como em todas as escolas, era parente de funcionário. Ela deveria ficar, mas chorou convulsivamente. A diretora prometeu aos professores que ela própria cuidaria para que a aluna entregasse as atividades que devia. Mas, na segunda, primeiro dia de dezembro, já não havia alunos.

A pedagoga se irritou com a cobrança da promessa, dizendo que os alunos não viriam. Havia ali dois alunos da turma. Um deles pegou o celular, e outro usou o telefone da papelaria em frente à escola. Eram quase oito da manhã. Às oito e meia, havia 26 alunos dos 32 da turma. Estudaram, capricharam, apresentaram os livros lidos, terminaram um projeto. Dois colegas professores aproveitaram e foram ao Paraguai, outra foi comprar um carro no interior de São Paulo. Mas, para o núcleo de educação, o fato de as aulas se encerrarem antes teria, porque teria, que ser atribuída à ausência de alunos.

Para a maioria dos alunos, a voz que eles queriam era aquela interior: alguém que fizesse as aulas acabarem 20 dias, um mês antes, que transformasse novembro em jogos e passeios, e que fizesse de aproveitamento algo acessório. Mais que isto, que garantisse o recurso de recorrer ao núcleo caso o conselho final reprovasse alguém. Diretores que leiam o pensamento, que se sintam como alunos ávidos para saírem da escola e sentarem na lanchonete, tudo isto tem composto a escola brasileira. Já vi o mesmo ocorrer em tantas cidades. Já era assim quando estudava e ano letivo acabava depois de finados. Fingir que as semanas finais serão dedicadas à recuperação, àquela que a lei diz que só pode ocorrer em contraturno ou fora dos 200 dias letivos, e passar esses dias... Deixa pra lá.

Se os finais de ano não forem assim, os alunos usam suas vozes e derrubam o diretor.

 

 

 

Para que serve o uniforme? E quem acredita que nessas coisas não há nenhuma participação de diretores de escolas?






Índice geralSão Paulo, terça-feira, 18 de setembro de 2012Cotidiano
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Londrina
Prefeito e empresários são denunciados
O prefeito de Londrina, José Joaquim Ribeiro (sem partido), o ex-prefeito Homero Barbosa Neto (PDT), cassado em julho, seis agentes públicos e um grupo de empresários foram denunciados ontem sob acusação de superfaturamento na compra de uniformes escolares. Segundo a Promotoria, R$ 3,8 milhões foram pagos de forma indevida às empresas fornecedoras e os empresários deram R$ 540 mil como propina.
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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Piada: o prefeito diz que o ensino é ótimo


O prefeito de Curitiba disse, no programa eleitoral de hoje pela televisão, que a cidade tem a melhor educação do país. Se ele se refere apenas à rede municipal, alguém precisa dizer-lhe que, para quem atua na rede estadual, o insucesso daquela é a causa de os alunos chegarem analfabetos à quinta série. Mesmo quando isto é mentira.

Em todo lugar do estado, tem-se como uma verdade demonstrada que o ensino público estadual tenta resolver as falhas deixadas pelas redes municipais. Mas basta olhar para as estatísticas, como as que existem no site Todos Pela Educação, e o que se constata é que o aluno vem tendo uma base melhor, e as coisas desandam na segunda fase do ensino fundamental. Não são boas essas escolas municipais. Ainda há mais crenças pessoais de professoras que estudaram apenas o magistério que o conhecimento pedagógico. Há mais Fausto Silva que Pestalozzi ou Montessori. E a professorada vai morrer dizendo que a vida na escola é mais importante que qualquer preparo acadêmico. Que saber como funciona a cabeça do aluno é besteira.

O número de alunos que acompanha o conteúdo de sua série, no país, é pouco maior que 25% na escola estadual; na municipal, aumenta um pouco, mas nada que chegue a representar sucesso. Evidentemente, há mentiras nesses números. Basta ver a última Prova Brasil. Ali só existem paráfrases do que está dito na superfície de textos. E os gêneros escolhidos não são nem um pouco complexos. O que se faz é dizer o que o que texto coloca no nível da superfície explícita com outras palavras. E isto é chamado de tema, ou de argumento, mas sempre é paráfrase. Raramente se chega ao nível das inferências ou da extrapolação. Ou elas ficam em um nível cognitivo muito abaixo do que se espera para a idade do aluno que faz a Prova Brasil. Quem leu Dascal sabe do que estou falando.

Mas a Prova Brasil joga para o alto o resultado exatamente daquele aluno que vai acabar a primeira fase, ou o ensino fundamental todo, sem saber ler. Afinal, o que ele lê é paráfrase. O que o aluno faz na sua vida escolar também é: Professora, é para responder com as minhas palavras? Professora, é para responder só o que está no texto?

Fica difícil dizer a um político que olhe onde estão as mentiras da rede escolar que ele administra. Mas quem atua com alunos desde 1984 consegue perceber as mentiras. E as verdades. Muitas vezes a verdade vira estatística porque o caminho para se chegar a ela é a estrada de tijolos amarelos, mas não a floresta onde impera a bruxa.  

domingo, 16 de setembro de 2012

Paranoia ou mistificação: o Colégio Santa Felicidade ignora as diretrizes sobre avaliação e defeca sobre os conteúdos oficiais


O que as escolas curitibanas vêm fazendo com tudo que se falou sobre avaliação nas últimas décadas?

Existem pessoas que fazem da sua atuação científica um pressuposto de vida. Para elas, os exemplos curitibanos que eu vou colocar aqui são uma afronta. É uma atitude de deboche para com o conhecimento científico, da mesma forma que diretores e funcionários do núcleo de educação ridicularizam desde o capítulo V da Constituição até o conhecimento que resulta das principais pesquisas feitas nas últimas décadas. Essa gente ridiculariza Vygotsky ou Wallon, como ignora Winnicott e ri de todo conhecimento científico desenvolvido fora da educação, mas que a escola deveria transmitir. Assim, quem está na universidade, nos centros de pesquisa, e acredita na ciência como suporte para ações que não visem apenas aos votos em candidatos profissionais à direção ou a cargos políticos, vê essas avaliações como uma vingança de gente que não pesquisa, não conhece teoria científica, odeia as propostas curriculares sérias, mas que está lá, sentada em sua cadeira, sem importarem os meios usados para chegar até lá.

Por exemplo, aqui abaixo seguem diversas atividades feitas por alunos do Colégio Estadual Santa Felicidade. Pode parecer piada, mas são atividades que representam a nota e o meio de se verificar se o aluno atingiu os objetivos pelos quais o contribuinte paga os salários do diretor, das pedagogas e dos professores. Em alguns casos, é a única nota, mesmo as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional proibindo.

Veja-se a atividade abaixo. Feita por aluno de ensino médio. Quem a olha não consegue perceber um único objetivo científico para alguém gastar tempo com isto. Mas o objetivo está presente em todas as escolas em que funciona ensino noturno: entregar algo que segure a nota sem aprendizagem, mas principalmente permita que alunos e professores possam sair da aula antes da hora.

E essas palavras riscadas em um papel são uma avaliação para essas pessoas:
 

 
Quem a riscou não foram crianças de pré-escola, mas a distância é curta. No aprendizado, naquelas habilidades e competências que justificam que a criança passe horas diárias na escola. Porque, na idade, a distância é imensa. A atividade abaixo é de um aluno de ensino médio, mas com idade de estar no meio de um curso universitário.



Repare a atividade. Ele não reconhece os tempos verbais. Não aqueles bem específicos, como imperfeito ou perfeito, mas o simples reconhecimento de que escreveu uma oração no passado e não no presente. Um aluno nulo, sem nenhuma informação que o habilite a frequentar uma universidade. E que escola empurra, sem que habilidades integrem suas preocupações. Não reconhecer tempos verbais no terceiro ano do ensino médio é um problema cognitivo, mas o aluno acha que isto pode ser resolvido escrevendo-se o que ele quer com giz de outra cor, coisas do tipo que levam o aluno a ações mecânicas. No caso, o aluno veio à escola uma semana depois de os demais terem participado de uma tosca e antipedagógica semana de provas. Feita em 2011, por falsos educadores. Essa atividade absurda corresponde, para eles, a uma avaliação, mesmo um teórico como Júlio Furtado (para não falar em Freire, Gadotti, Antunes) dizendo que não:

 
                                      A avaliação que só constata (e que, na essência, não é avaliação, mas apenas “exame”) é fruto de uma pedagogia comprometida com a consolidação de uma sociedade burguesa, em que operações como constatar, classificar e excluir são processos vitais para garantir a permanência dessa mesma sociedade. [...] A simples constatação (que insistimos em chamar de avaliação) é uma situação estanque, na qual o aluno “interrompe” seu processo de aprendizagem para mostrar o que aprendeu. É pontual. Apenas uma fotografia do que se sabe no momento, sem nenhum compromisso com o processo que gera a aprendizagem. Passado e futuro são ignorados nessa situação. O que vale é o presente, “formatado” para constatar o que se sabe aqui-e-agora. A cena de um aluno que, dez segundos depois de entregar a prova, sem ter saído ainda da sala, diz ao professor: “Puxa, acabei de perceber que fiz bobagem numa questão, posso revê-la?”, seguida da resposta que ele quase certamente receberá de pelo menos noventa por cento dos professores exemplifica muito bem o caráter estanque da constatação. [...] Desse modo, a avaliação que só constata é excludente, pois não assume nenhum compromisso com o “vir-a-saber” do aluno. [...] A real avaliação não é uma fotografia, é um filme. Leva em conta o passado, o presente e o futuro. [...] A avaliação que apenas constata não é somente “herança de uma guerra santa”; é também um mecanismo de manutenção social que em muito serve à sociedade “neo-burguesa” em que vivemos. Quebrar a lógica da avaliação é quebrar a lógica social, o que exige um alto nível de comprometimento social do professor.

 

O que Celso Vasconcellos escreve também é algo sabido (menos nessas escolas; menos dos funcionários pagos para levarem essas coisas a sério):

 

                                      No enfrentamento da distorção do processo de avaliação de ensino-aprendizagem, temos apontado a necessidade de superação da avaliação tipo “prova”. Queremos deixar claro que estamos nos referindo à prova entre aspas, qual seja, àqueles “momentos especiais”, com rituais especiais, dificuldades especiais, etc., que representam uma verdadeira descontinuidade na prática pedagógica, e não às atividades – escritas, inclusive – que o professor utiliza no cotidiano da sala de aula para coletar informações sobre a aprendizagem dos alunos. [...]

                                                            A avaliação deixa de ser considerada como uma dimensão da aprendizagem, para ser apenas a com-“prova”-ação do que o aluno sabe.

                                                            Na prática, quais os motivos que levam o professor a usar a “prova”? É mais cômodo (permite um tempo para “respirar”, corrige tudo de uma vez, etc.); o docente tem a visão de que “sempre foi assim”, não percebe a necessidade de mudar; não sabe fazer diferente; sente-se seguro assim, já que há uma legitimação social para este tipo de prática (especialmente em termos de preparação para os exames); existe a possibilidade de usá-la como ameaça para o aluno (forma de controle de comportamento); e localiza o problema no aluno, não se questionando o processo. (Grifos do autor.)

 

 

Repare que Furtado fala exatamente daquele modelo de falsa avaliação chamada “prova”, que é feita a partir de rituais que não têm nada a ver com o processo de aprendizagem. E Vasconcellos, dos vergonhosos rituais que os professores tentam trazer da sua escola, como se ela tivesse sido ótima. No caso específico do Colégio Santa Felicidade, essa prova é um imbróglio criado por professores que acreditam terem estudado numa escola perfeita. Ela nem é feita pelo professor da disciplina, que acompanha o aluno, mas por uma ou duas pedagogas que jamais leram a proposta curricular do estado. Se leram, não compreenderam. Nem acham “legal” compreender, pois o aluno estaria obrigado a mostrar habilidades e conhecimentos, e isto a escola não quer, nem os pais, nem a APMF, e o diretor quer notas azuis. Mesmo que o aluno passe o bimestre colorindo sacis e cucas. E eles colorem. Para saírem mais cedo. Vasconcellos fala sobre o “sempre foi assim”, raciocínio generalizado entre as funcionárias dos setores do núcleo, que querem que esses rituais sejam repetidos e resultem em aulinhas para amigas que, como elas, não têm um deputado que as encaixe em cargos públicos sem que cumpram as obrigações que o Conselho Nacional de Educação estabelece para elas.

O aluno das orações acima, que já deveria saber escrever textos sérios em inglês, entrou na sala depois de metade da aula transcorrida. Onde ele estava? Os alunos do referido colégio fumam no corredor. Tabaco. E outras coisas no banheiro, que os fazem passar aulas debruçados nas carteiras. Com os coleguinhas alertando: Mexer com eles é perigoso! Na semana de provas, que a pedagoga elaborou a partir de seus livros lá da década de 80, ele faltou. Afinal, a escola dá uma prova de recuperação valendo toda a nota do bimestre. A LDB deixa claro que isto não pode ocorrer. Mas o que é a LDB em Curitiba? O que coloca diretores de escolas nas suas cadeiras é o apoio a ações como o tabaco entre alunos que votam. Garantir a liberdade de uso de tabaco (e ignorar o que se faz no banheiro) é uma garantia de se terem votos.

A folha abaixo é a reprodução da recuperação de tal aluno. Dez X feitos em uma folha. Nada que corresponda à série. Nada que corresponda à idade. Nada que corresponda às diretrizes nacionais. Nada que corresponda às diretrizes do estado. idêntica à prova original, que o aluno nem veio fazer, pois se fizesse precisaria de outras atividades e de comparecer a outras aulas. Veja-se:


Comparem-se os tópicos da “avaliação” feita pelo aluno com o da proposta curricular oficial do estado. Não restou nada. Olhe-se o que é para ser avaliado. Não restou nada. E a proposta oficial deixa claro:

 

Nesse quadro, os conteúdos básicos estão apresentados por série e devem ser tomados como ponto de partida para a organização da proposta pedagógica curricular das escolas. (...) Por serem conhecimentos fundamentais para a série, não podem ser suprimidos nem reduzidos, porém, o professor poderá acrescentar outros conteúdos básicos na proposta pedagógica, de modo a enriquecer o trabalho de sua disciplina naquilo que a constitui como conhecimento especializado e sistematizado

 

 

Acrescentar conteúdos? Ou seja, não cabe ao professor excluir os conteúdos da tabela, em nome de uma pretensa natureza local, de uma cultura específica. O que o professor pode é ultrapassar esses conteúdos. São esses conteúdos que garantem ao aluno os conteúdos básicos, não importa aonde ele vá. Mas, imagine-se dar ao aluno esse direito!  

Por falar nisso, aqui estão eles:

 Conteúdos básicos                      Encaminhamentos teórico-              Avaliação
                                                     metodológicos
 
GÊNEROS DISCURSIVOS E SEUS ELEMENTOS COMPOSICIONAIS.
Caberá ao professor a seleção de gêneros, nas diferentes esferas sociais de circulação, de acordo com a Proposta Pedagógica Curricular e com o Plano de Trabalho Docente, adequando o nível de complexidade a cada série.
* Vide relação dos gêneros ao final deste documento.
LEITURA
Identificação do tema;
Intertextualidade;
Intencionalidade;
Vozes sociais presentes no texto;
Léxico;
Coesão e coerência;
Marcadores do discurso;
Funções das classes gramaticais no texto;
Elementos semãnticos;
Discurso direto e indireto;
Emprego do sentido denotativo e conotativo no texto;
Recursos estilísticos ( figuras de linguagem);
Marcas linguísticas: particularidades da língua, pontuação; recursos gráficos (como aspas, travessão, negrito);
Variedade linguística.
Acentuação gráfica;
Ortografia.
ESCRITA
Tema do texto ;
Interlocutor;
Finalidade do texto;
Intencionalidade do texto;
Intertextualidade;
Condições de produção;
Informatividade (informações necessárias para a coerência do texto);
Vozes sociais presentes no texto;
Vozes verbais;
Discurso direto e indireto;
Emprego do sentido denotativo e conotativo no texto;
Léxico;
Coesão e coerência;
Funções das classes gramaticais no texto;
Elementos semãnticos;
Recursos estilísticos( figuras de linguagem);
Marcas linguísticas: particularidades da língua, pontuação; recursos gráficos (como aspas, travessão, negrito);
Variedade linguística;
Ortografia;
Acentuação gráfica.
 
ORALIDADE
Elementos extralinguísticos: entonação, pausas, gestos, etc ...;
Adequação do discurso ao gênero;
Turnos de fala;
Vozes sociais presentes no texto;
Variações linguísticas;
Marcas linguísticas: coesão, coerência, gírias, repetição;
Diferenças e semelhanças entre o discurso oral e o escrito;
Adequação da fala ao contexto;
Pronúncia.


 
LEITURA
É importante que o professor:
Propicie práticas de leitura de textos de diferentes gêneros;
Considere os conhecimentos prévios dos alunos;
Formule questionamentos que possibilitem inferências sobre o texto;
Encaminhe discussões e reflexões sobre: tema, intenções, intertextualidade, aceitabilidade, informatividade, situacionalidade, temporalidade, vozes sociais e ideologia;
Proporcione análises para estabelecer a referência textual;
Conduza leituras para a compreensão das partículas conectivas;
Contextualize a produção: suporte/ fonte, interlocutores, finalidade, época;
Utilize textos não-verbais diversos: gráficos, fotos, imagens, mapas e outros;
Relacione o tema com o contexto atual;
Oportunize a socialização das ideias dos alunos sobre o texto;
Instigue o entendimento/reflexão das diferenças decorridas do uso de palavras e/ou expressões no sentido conotativo e denotativo, bem como de expressões que denotam ironia e humor;
Estimule leituras que suscitem no reconhecimento do estilo, próprio de diferentes gêneros;
ESCRITA
É importante que o professor:
Planeje a produção textual a partir da delimitação tema, do interlocutor, intenções, intertextualidade, aceitabilidade, informatividade, situacionalidade, temporalidade e ideologia ;
Proporcione o uso adequado de palavras e expressões para estabelecer a referência textual;
Conduza à utilização adequada das partículas conectivas;
Estimule a ampliação de leituras sobre o tema e o gênero propostos;
Acompanhe a produção do texto;
Acompanhe e encaminhe a reescrita textual: revisão dos argumentos das ideias, dos elementos que compõem o gênero.
 
Conduza a uma reflexão dos elementos discursivos, textuais, estruturais e normativos.
ORALIDADE
É importante que o professor:
Organize apresentações de textos produzidos pelos alunos levando em consideração a aceitabilidade, informatividade, situacionalidade e finalidade do texto;
Oriente sobre o contexto social de uso do gênero oral selecionado;
Prepare apresentações que explorem as marcas linguísticas típicas da oralidade em seu uso formal e informal;
Estimule contação de histórias de diferentes gêneros, utilizando-se dos recursos extralinguísticos, como: entonação, expressões facial, corporal e gestual, pausas e outros;
Selecione discursos de outros para análise dos recursos da oralidade, como: cenas de desenhos, programas infanto-juvenis, entrevistas, reportagem entre outros.


 
LEITURA
Espera-se do aluno:
Realização de leitura compreensiva do texto;
Localização de informações explícitas e implícitas no texto;
Posicionamento argumentativo;
Ampliação do horizonte de expectativas;
Ampliação do léxico;
Percepção do ambiente no qual circula o gênero;
Identificação da ideia principal do texto;
Análise das intenções do autor;
Identificação do tema;
Dedução dos sentidos de palavras e/ou expressões a partir do contexto;
Compreensão das diferenças decorridas do uso de palavras e/ou expressões no sentido conotativo e denotativo;
Reconhecimento de palavras e/ou expressões que estabelecem a referência textual;
ESCRITA
Espera-se do aluno:
Expressão de ideias com clareza;
Elaboração de textos atendendo:
- às situações de produção propostas (gênero, interlocutor, finalidade...);
- à continuidade temática;
Diferenciação do contexto de uso da linguagem formal e informal;
Uso de recursos textuais como: coesão e coerência, informatividade, intertextualidade, etc;
Utilização adequada de recursos linguísticos como: pontuação, uso e função do artigo, pronome, substantivo, etc;
Emprego de palavras e/ ou expressões no sentido conotativo e denotativo, bem como de expressões que indicam ironia e humor, em conformidade com o gênero proposto.
 
ORALIDADE
Espera-se do aluno:
Pertinência do uso dos elementos discursivos, textuais, estruturais e normativos;
Reconhecimento de palavras e/ ou expressões que estabelecem a referência textual;
Utilização do discurso de acordo com a situação de produção (formal/ informal);
Apresentação de ideias com clareza;
Compreensão de argumentos no discurso do outro;
Exposição objetiva de argumentos;
Organização da sequência da fala;
Respeito aos turnos de fala;
Participação ativa em diálogos, relatos, discussões, quando necessário em língua materna, etc.;
Utilização consciente de expressões faciais corporais e gestuais, de pausas e entonação nas exposições orais, entre outros elementos extralinguísticos.


 

Os conteúdos básicos oficiais para o terceiro ano do ensino médio. Ou seja, a etapa final, quando os conhecimentos não estão em início, mas em finalização. Jogados fora. Uma funcionária do setor Santa Felicidade chegou a dizer que esses conteúdos são apenas uma sugestão. Ela não percebe o absurdo da proposta curricular da escola sob sua supervisão. Super. E o diretor dizia que a estratégia confirmada por toda a literatura científica como inócua e prejudicial, e proibida em 2008 na maioria dos núcleos de educação do estado, estava dando ótimos resultados em seu colégio. O resultado está nos caça-palavras, nas provas como a do aluno acima. Ele obteve 9,0 pontos tendo feito apenas essa loucura. Ótimo resultado: a escola merece medalhas. Quem sabe o que é IDEB sabe o quanto o número de aprovados em terceira série pesa no índice da escola. Nas ninguém olha se apenas 3 alunos fazem ENEM, e se os conteúdos são crias molhadas da placenta de professores sem conhecimento.

Repare que nenhum dos conteúdos presentes na proposta oficial consta da prova feita pelo aluno. Repare que nenhuma das práticas (oralidade, escrita e leitura) está lá. O que está ali é exatamente o que os currículos dizem para não se fazer. Mais que currículos: o que os profissionais da universidade condenam. Repare agora o currículo do Colégio Santa Felicidade:

 

Pode parecer piada. É trágico, porque atropela o conhecimento científico sobre a disciplina, atropela o processo de aprendizagem do aluno. É ridículo, sim. Merecia uma sátira em algum programa humorístico: a pedagoga que penteia os cabelos longos e loiros enquanto elabora provas copiadas de livros didáticos condenados pelo MEC e pela SEED. Mas o resultado será sempre o aluno vitimado em sua própria capacidade. O aluno que aprende inglês em escola paga, e que vira um perfeito-idiota nas mãos de quem recebe para levá-lo ao conhecimento. Conhecimento que a pedagoga não possui. Nem os professores da disciplina do referido colégio. Novamente, chegam até lá sem terem sequer lido as diretrizes curriculares. Como disse uma aluna do ensino médio do referido colégio: a única coisa que ela aprendeu naquele colégio, na sexta série, foi a fumar. A aluna é a imagem que sintetiza tudo que os profissionais daquele colégio fizeram com a informação responsável. Um barato! Este se transforma em baforadas tomadas de vez em quando. E que fazem imenso mal. Mas que têm sustentado legiões de perfeitos-idiotas em suas caminhonetes de cabine dupla. E o aluno que só vai se preocupar com habilidades e conhecimentos quando se matricular em um curso pago faz um gesto obsceno diante da escola: Desta eu me livrei!